Thursday, November 14, 2024

FC - 3 meses que passam

Memórias. De lugares que certamente nunca mais verei. Surgiu-me ao ver esta fotografia:

Falavas, há muito tempo, nas tuas meninas. Tinhas orgulho nelas, no que se passou para que crescessem  no meio de tanta confusão de sentimentos e acções. Há muito tempo que as não vejo quando durante tantos anos as via. Passámos férias juntos. Guardaste as tuas "coisinhas" muito bem arrumadas a um canto que pouca gente conhece. Passeio-me por ele e as lembranças, visto que não posso falar com ninguém sobre isto ou aquilo.

Conheço as jarras, a boneca, o santuário em madeira, que trouxeste da tua avó
Conheço o que inventaste
Sei do teu perfume preferido: "Calèche" de Hermès.

Reconheço os quadros que te dei

Tínhamos uma relação muitas vezes conflituosa há mais de 60 anos, com as dores e os risos da adolescência, e os caminhos diversos que, entretanto, cruzámos. (vou guardar a nossa fotografia feliz, ambas a rir, à entrada de Holland Park). Como cenas de filme, vêm-me ao pensamento mil ideias de ti:

- O teu quintal, a sala onde estudávamos e escrevíamos bilhetinhos entre os livros, os risos disfarçados, porque a vigilante mal encarada estava sempre perto; desde a "Jóia" que me acompanhava de tua casa à minha. Nem sabes que me lembro perfeitamente do teu primeiro saia e casaco, onde o comprámos, os quadrados azul escuro e branco: sempre que havia um casamento ou festa na "aldeia", a tua mãe comprava-te uma fatiota nova. Eu nunca tinha nada novo mas ficava tão feliz com a tua alegria!

- Dos risos e trabalhos que passámos em Londres, vejo-te pela manhã, às 7h, a limpar o grande átrio do  velho hotel; vejo-te a tricotar, a costurar à mão, a fritar batatas directamente para a sertã, na velha cozinha, a rir, sentada no marco de correio vermelho onde mandávamos as cartas para casa.

- Da partida quase clandestina em que te compusemos um enxoval de coisinhas pequenas de Londres, lençóis e um cobertor roxos, e o álbum branco dos Beatles. Um cachimbo para o teu amor. Para onde iriam? O que vivemos e o que soubemos mais tarde, daria um romance se eu o soubesse escrever.

Só depois do 25 de Abril nos tornamos a ver.

Não me apetece falar de mais coisas. Deixo-me com as paisagens de ti, as que vias todos os dias



Tão diferentes, tão idênticas.



1 comment:

M. said...

Apenas sombras ou também luz?