Wednesday, November 7, 2018

O Casaco

Passam meses, passam anos.
Acho que só tenho uma maneira de viver de acordo comigo: repartir, coisas ou sensações. Pelo bem, pelo bem, trá-lá-lá...
Tenho pensado nos últimos anos que "se me retornasse tudo o que dei" na vida, seria uma pessoa mais rica, seguramente. Decisão de (algumas) pequenas arrumações, que as grandes são de outros tempos atrás: listas que fui fazendo, propósitos, que ia riscando à medida de os ter feito. Passos gigantescos, memórias agarradas como musgo antigo.
Desta vez, entre outras coisas, o "casaco de redingote"! Fui ver o termo que me ocorreu mal peguei nele, tantas são as vezes que palavras recuadas no tempo e tão estranhas me surgem no pensamento.
Do inglês: casaco de equitação riding coat e do francês: redingote sobre casaca.
Apareceu guardado desde um casamento há mais de 25 anos.
O noivo morreu há muito tempo, a noiva contente, que vou vendo às vezes, está baça e chupada como uma castanha pilada, não necessariamente por causa da falta do marido mas porque as pessoas têm percursos insondáveis. Um caminho aos zig-zags, complicado, mas qual o não é? Neste caso, um despropósito da vida, onde se nota "a cruz" assumida, de uma parecença ou marca familiar marcante. Do filho, uma criança encantadora nos primeiros tempos, não me recordo de o ver nos últimos anos; e o que sei agora não é de molde a querer sequer trocar olhares ou palavras com ele.
Comprado para a ocasião, poucas vezes foi usado, visto que me tornei prática, caseira e desempregada, pouco tempo depois.
Eis o que vai... e fica a marca neste lugar escondido, de poucas palavras, mas que hoje me apeteceu de "muitas".
Nenhuma "pobrezinha" o poderá vestir, a menos que sirva de cobertor a um sem-abrigo.


As ironias que me assaltam e que só posso confessar a mim mesma: tanta blusa, tanto fato, tanta carteira em couro, tanta secretária-gerente-sócia. Puff.
Tantas coisas de que já me livrei e outras tantas para me livrar!
Adeus "redingote"!