Tu chamavas à tua mãe "Mãezinha", eu não me lembro de o ter feito a ti. Talvez quando era pequenina te tivesse sussurrado assim, ou certamente o fiz nos dias últimos em que o teu olhar já era vago.
Hoje é o dia em que nos obrigam a pensar nos que se foram. Não vou há anos ao lugar da família, que o Reinaldo comprou e escolheu à sua vontade, sem nada querer saber do que "nós", as mulheres da casa, poderiam decidir. Sabes que sou selectiva: dantes ia sentar-me ali em frente a falar e a pensar na Vitorinha e, contudo, estava a avó Laura ali ao pé. Nos primeiros anos também ia, falava-te que finalmente tinha posto o teu marido/meu pai em lugar subalterno: a teus pés. Agora, as forças ou a saúde vão-me abandonando e o fio da vontade vai-se tornando fininho.
Nem te lembras tu mas lembro-me eu: aquele vestido foi feito por ti, era verde muito claro com bolas verde escuro, eu tinha o babeiro azulado de folhos e aos quadradinhos, a tua amiga da "alfaiaria" era a Judite. Vês como eu tinha um ar assustado? Mal reparavas o difícil que era para mim vivermos com a "pata em cima".
Mas saberás que todos, todos os dias me lembro de vós, mãe-avó e filha-mãe. Nos gestos, nos ditos, na cozinha. Estás no quarto antes de dormir, com os teus belos cabelos e sorrisos. Dizias que não querias flores de plástico e durante anos pagámos as tuas flores naturais à vizinha, que tanto te gostava e tratou do teu lugar. Por isso, hoje pus na tua/vossa imagem uma flor de papel, uma esteva branca, do Alentejo que nunca viste. E para te afirmar que a "menina" é como um flor: havias de gostar muito dela. Certamente um gostar alegre, como gostaste de mim e me permitiste nascer.
Tem olhos azuis, cabelo castanho com mechas mais douradas e queres saber? encontro-lhe parecenças com a expressão terna e de aristocrata do tio Leonel. Sabes que sou muito imaginativa com aquilo que me toca no íntimo. Havemos de a observar no Universo, de uma estrela algures, combinado, Mãe?
1 comment:
Ternura no teu pensamento e palavras.
M
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