Tuesday, December 22, 2009


O silêncio prateado - aquele que te não é imposto, o que escolhes.
O silêncio de ouro - quando o fazes em ti para não ferir os outros.
O silêncio vermelho - o da raiva de não poder esclarecer ou falar de.
O silêncio cinzento - o da impotência de ouvir.

O silêncio arco íris que preferimos a outros.

O silêncio das pedras que todavia falam. São as que ouço melhor.

O tempo arrasta-nos, a folha desliza na água, rodopia, 10 anos são um átomo na humanidade e um tão grande hiato em nós.
Renascemos cada dia e morremos cada dia.

E sempre digo que a ternura, o amor, o fraterno laço
ah...esses são os renascimentos sempre que acontecem.
Os pombos da minha janela, árvore esperançada e casas velhas.

Como diria Saramago: para onde irão os pombos se prédios novos com anti-pombo instalado?

Transição





Meus túneis de verdes
minhas passagens secretas
que se vão desfazendo do espírito, mesmo que o convoque na solidão de mim.

Rostos que perdem os traços, gestos que perdem os rostos.

Tuesday, December 15, 2009

Interrogação





Fico-me a pensar
na pena
e que valerá esta pena de pensar?
Na impavidez

(não, não da Natureza; das gentes que (se) morrem matam negoceiam mentem tergiversam)
Gostei do verbo que me surgiu; e no dicionário explicado precisamente o que eu queria

tergiversar: voltar as costas; usar de evasivas, rodeios ou subterfúgios

Poderia dizer-se subterfugas? aos que tergiversam ...
Tanto brilho de um lado e tanta penumbra de outro!

Wednesday, November 25, 2009

Estando estátua




Uma espécie de ficar com aparência de ir.
Visto que é preciso parecer pessoa.
Aos encontros, aos telefones, ao natal, aos convites.

Visto que é preciso parecer.
Que se brilha, que se está atento
(mesmo com alma de pássaro em jardins improváveis).

Tuesday, November 10, 2009

Sinto-sento





Sinto-me este barco, adornada pelos laços que tanto me levam ao largo como me prendem a terra.
Há dois troncos; unicamente dois que conseguem ter por mim "o amor incondicional do conhecimento".
Diria "do não-egoísmo de nós".

Depois, estes meses são tristes, as ruas cinza.

"...nothing can bring back the hour of splendor in the grass..."

Quero é sopas e descanso.

Thursday, October 29, 2009

Tempos


Há dias o espanto de encontrar cogumelos selvagens
belíssimos.
Nunca tinha visto - e logo os sorrisos de tantos, o veneno de tantos
me colheu o olhar
que aqui deixo.

(tanto sofro de metáforas que parece doença!)

Tuesday, August 25, 2009

As redes


Por mais que se queiram juntar as pontas
e não sair marcada de arranhões
íntimos ou visíveis

sempre me parece que o rolo se enrola mais.

Tuesday, August 18, 2009

Na noite algures


Aguento
suspenso nessa outra noite
um pesadelo

um templo.

Divindade perdida.

Monday, August 10, 2009

Algures na noite



Não queria deixar que os pensamentos
perturbantes
em uma das muitas madrugadas
de dias mal nascidos
de escuros mal dormidos,
me evitassem o olhar no peito das gaivotas
clarificado pela luz primeira da manhã.

A mulher-corda-violino de memória

Ficar
a criança num gesto de defesa para o que não entende
mão erguida evitando falso o brilho
braço que agarra a travesseira que a protege
dos gumes

E hoje como antes a Eu nos gestos repetidos.

Thursday, July 9, 2009

De esperar




Algo de sede
algo de sombra
algo de máscara
sentada roendo horas.

Eis as faces de eva longe de paraíso.
Eis a mulher-ave-do-paraíso-inatingível.

Pouco barulho, então, meus dias.
Fiquem-se na escada interior.

Wednesday, May 6, 2009

Onda




Gigante, cheia de sinais. Aflição continuada de não os (re)conhecer
nem (de)cifrar.

Do livro "O Leitor" de Bernhard Schlink

"Pensei que, quando se deixa passar o momento certo, quando alguém recusou algo tempo de mais, quando nos é recusado algo tempo de mais, esse algo chega forçosamente demasiado tarde mesmo que seja realmente desejado com força e acolhido com alegria. Talvez "tarde de mais" não exista, apenas tarde, e "tarde" seja sempre melhor que "nunca"? Não sei."

Não sei!

Monday, April 20, 2009

Domingo






As paredes. A voz no labirinto.
Será que alguma vez mais poderemos passear as duas?
Falar sereno?
Falar futuro?
Ver frutos?

... senti-me amarrotada por dentro.

Thursday, April 2, 2009

Possivelmente







... sinto o que esta planta sente.
E volto-me para o interior das folhas.
(parece-me que a natureza humana divide, nos canteiros das suas vidas, cada vida. Ou será porque corações são tantas vezes cactos escondidos? Eu gosto tanto do campo e o ser expontâneo crescer flor entre ervas!)

E há também a palmeira que se julga alta, tão frágil nas mãos abertas em azul.
Dobra, não parte. Ainda.

No tronco, as dores do vento.

Wednesday, March 18, 2009

Só a mente





Um mês depois de lembrar os jardins de Bagatelle. Oito anos passados as flores estarão lá, nunca as mesmas que vi.

Ando pela beira da praia de todo o meu tempo.
Entre as ondas cavadas e retendo um pouco do sol poente.
A luz não demorará a ir embora, para um dia outro, um diferente lugar.

Este movimento da rotação de viver.

Wednesday, February 18, 2009

Cheiro da noite






Apesar de sentir 6º do frio na noite, há como que um perfume espalhado.
O que será que o sol durante o dia despertou nos ramos da minha árvore?
Nos vasos dos vizinhos? Nas trepadeiras dos muros velhos?
Imperceptíveis mudança de seiva.
Que me chegariam. Deveriam chegar-me.
Para saber de outro tempo onde se aconchegarão
as cores e os troncos
as flores e as aves.

Thursday, January 29, 2009

Por outro lado




...tenho pernas para andar. Um sol ao longe e um anjo de tutela.
Em tempo útil, haveria de ter percebido a troca.
Das margens.
Das linhas.

Tuesday, January 27, 2009

Do outro lado


Vou recolhendo as minhas redes.

Há décadas atrás não havia condomínios virados para o rio.
Os domínios iniciavam-se em mim.
Hoje sou uma margem organizada, de certa maneira não agradável.
Mas para alívio de todos, estou no meu lugar.
Acanhada nas margens.

Saturday, January 24, 2009

Sem cor para lembrar



Nenhuma cor consegue quebrar o espessante nevoeiro.
Instalado nas vidas que passam lá fora.
Entra-me pelos vidros e espalha-se no descontente chão do meu tempo.

Thursday, January 15, 2009

Pés quase descalços




Mesmo assim, andem por aí.
Camuflados que seja. Sombras ou artifícios.

Não se pendurem, vazios e sózinhos.