Tuesday, April 2, 2024

Os dias da Páscoa 2024

De tanto burburinho, dias com gente, fica o silêncio e um monte de coisassoltas... pequenas lembranças dos encontros:

As camélias que me trouxeram de Paredes de Coura, os dedinhos pintados a brincar, uma caixa de Klimt, um DVD do British Museum, os livros de passeios dos anos 80, da Mobil, as obras de Luís de Camões, uma caixa e tacinha antigas de Londres, o cavaleiro e o cavalo da exposição dos Guerreiros de Xian.

Pequenas coisas de companhia para este dia de chuva e vento. Agarram-me ao presente.


Sunday, March 10, 2024

Coisas antigas

Acontece algo de extraordinário quando assomam à memória recordações com quase 70 anos!

Nos anos 50, éramos visitados pelos "padrinhos" e família das duas aldeias de origem dos avós, Pombal e Valdigem, por brasileiros ligados família da madrinha da minha mãe(?), por amigos de amigos, geralmente gente com instrução e ideias republicanas ou, pelo menos, avançadas e proibidas à época. Lembro-me do café Rivoli e o grupo de amigos do meu pai, do Âncora d'Ouro, onde havia empregados à frente dos quais não devíamos falar de "certas coisas" (sabia-se que eram informadores da Pide), de alguns companheiros de campismo, do "Freitas", um pai de família visionário e muito culto, que sabia o nome e a posição das estrelas. Gente alternativa dessa época cinzenta. Os que emprestavam livros que não existiam nas livrarias e que o meu pai encapava em papel costaneira para esconder os títulos "subversivos". Daí as minhas leituras extravagantes nesse tempo. Como aprendi a ler muito cedo e adorava livros, lia tudo: Ferreira de Castro, Virgílio Ferreira, Aquilino Ribeiro, Emílio Zola, Jorge Amado, Joracy Camargo... eu sei lá! De todas essas experiências bebi, baixinha de idade dos 5 aos 10/11 anos mas atenta a tudo o que se passava e ouvia.

A determinada altura, apareceu um casal, mais velho que os meus pais, que professavam a religião Bahá'i e eram extremamente simpáticos e prestativos. Sabia eu que eram boas pessoas, iranianos ou seja, nesses anos eram persas pois vinham da Pérsia. De locais ou reuniões não me lembro mas eram visitas lá de casa. Mais tarde aprendi que professavam uma religião que dava relevância à união espiritual de toda a humanidade. Davam-nos muitas pequenas coisas: panos de tabuleiro, bordados como aqui não havia, utensílios de cozinha... Tudo nos era desconhecido pois não havia "supers" ou "hipers" com a panóplia de fornecimentos que existem agora.

Quando há 12 anos nos desfizemos da casa de meus pais, andavam por lá arredados dos olhos, estes pratos, não sei se são de vidro ou pirex. Das poucas coisas que recuperei. Um dia destes saíram-me ao caminho e fizeram-me lembrar aquelas pessoas e aqueles tempos descoloridos. Não me lembro se tinham chávenas, seriam apenas pequenos pratos ladeiros...

Gosto muito das cores deles e andam agora a ser usados, lembrando os amigos persas e a sua religião de boas práticas para uma Humanidade mais justa. 

Talvez porque hoje é dia de eleições e eu vi no boletim de voto nomes e símbolos cujos promotores - "democráticos", pois claro! - desconheço totalmente. O mundo está de pernas para o ar e já é indefinível a separação entre a verdade e a mentira.




Sunday, February 25, 2024

Um aniversário

...sem cor. Já o tempo me deixa apenas imagens fugidias, a preto de branco, dos teus lugares. E a surdez da tua voz. Farias anos hoje.

 Nunca pude dizer tantas coisas! Também nunca as pude explicar. 

"nunca" é uma palavra atroz.



Monday, February 19, 2024

Livrinhos

Literatura e música (além das fotos...!!!) é o que mais há por esta casa. Há 50 anos que aqui vivemos!

Desde pequenina que as duas fazemos rabiscos e colagens. Há 5 anos que penso em livros e escrevo histórias para "uma criança". Não que tenha imaginação por aí além, até admiro muito quem escreve e ilustra de uma forma didáctica e infantil. Ajuda-me a recordação que tenho de contar coisas ao pequeno-menino há décadas.



 

Dá-me gosto desenhar, pintar e escolher palavras simples mas dirigidas à inteligência sagaz e à memória de S. Ninguém imagina o que as crianças pensam.

E é como uma ligação, na distância, no tempo. De tudo o que nunca terei tempo para "lhe passar".


Wednesday, December 20, 2023

Atípico, o Natal 2023

Galopam os dias, de Dezembro, desordenados, na direcção das festas e mais festas. E sem um amanhã agradável. 


Parte do meu coração está em Lisboa. "Somewhere over the rainbow..."

Tivesse eu os sapatinhos vermelhos e mágicos da Dorothy

 


Wednesday, November 1, 2023

Mãe - Lembrança

Tu chamavas à tua mãe "Mãezinha", eu não me lembro de o ter feito a ti. Talvez quando era pequenina te tivesse sussurrado assim, ou certamente o fiz nos dias últimos em que o teu olhar já era vago.

Hoje é o dia em que nos obrigam a pensar nos que se foram. Não vou há anos ao lugar da família, que o Reinaldo comprou e escolheu à sua vontade, sem nada querer saber do que "nós", as mulheres da casa, poderiam decidir. Sabes que sou selectiva: dantes ia sentar-me ali em frente a falar e a pensar na Vitorinha e, contudo, estava a avó Laura ali ao pé. Nos primeiros anos também ia, falava-te que finalmente tinha posto o teu marido/meu pai em lugar subalterno: a teus pés. Agora, as forças ou a saúde vão-me abandonando e o fio da vontade vai-se tornando fininho.


Nem te lembras tu mas lembro-me eu: aquele vestido foi feito por ti, era verde muito claro com bolas verde escuro, eu tinha o babeiro azulado de folhos e aos quadradinhos, a tua amiga da "alfaiaria" era a Judite. Vês como eu tinha um ar assustado? Mal reparavas o difícil que era para mim vivermos com a "pata em cima".

Mas saberás que todos, todos os dias me lembro de vós, mãe-avó e filha-mãe. Nos gestos, nos ditos, na cozinha. Estás no quarto antes de dormir, com os teus belos cabelos e sorrisos. Dizias que não querias flores de plástico e durante anos pagámos as tuas flores naturais à vizinha, que tanto te gostava e tratou do teu lugar. Por isso, hoje pus na tua/vossa imagem uma flor de papel, uma esteva branca, do Alentejo que nunca viste. E para te afirmar que a "menina" é como um flor: havias de gostar muito dela. Certamente um gostar alegre, como gostaste de mim e me permitiste nascer.

Tem olhos azuis, cabelo castanho com mechas mais douradas e queres saber? encontro-lhe parecenças com a expressão terna e de aristocrata do tio Leonel. Sabes que sou muito imaginativa com aquilo que me toca no íntimo. Havemos de a observar no Universo, de uma estrela algures, combinado, Mãe?

 

Monday, October 16, 2023

Décadas nas boas-vistas e as metáforas

Não sei onde esconder, ou revelar em escrita, estes 49 anos "aqui".

Os andares que procurei nesta zona, perto do emprego. Um acaso que tenha sido dois meses antes do 25 de Abril. A minha senhoria dizia quando éramos obrigados a falar com ela: "tiveram sorte, passados dois meses não vos alugava...". Coisas agradáveis da senhoreca da Foz que nos respondia, anos depois, também: "que não vendia porque não precisava de dinheiro". 

Isso foi no tempo em que se partilhavam despesas com outro casal por grande necessidade. O sofá estava na parede em frente à janela da sala porque se via o mar, céu e o pôr do sol. Muito horizonte. Um dia, anos depois, voltávamos de férias com amigos, e ficamos em sobressalto: as ruínas de uma fabriqueta na esquina da rua, estavam a ser demolidas. O cerco apertava-se: a tipografia da Lello, um edifício baixo, e os jardins das traseiras, também levaram sumiço. A construção do prédio de gaveto em frente foi por fases nos anos seguintes. Reparávamos que nos iam "fechar": a poucos metros das varandas das traseiras ficamos voltados uns para os outros e foi-se construindo o quarteirão inteiro. Chegámos ver alguns dos primeiros andares para venda, eu e a minha mãe. Mas é sempre verdade que os "donos do dinheiro" têm sempre a última palavra. Neste caso, foi o meu senhor pai que nunca pôs a hipótese de viver perto da única filha.

Fechámos a varanda e pusemos persianas, tentando ter algum recato. Nestas décadas, mudaram muitas coisas, para pior: cortaram a minha árvore em frente e, há um ou dois anos, as construções alteiam-se à volta, num despudor moderno. As fotografias da árvore-saudação são de 2009.




Quanto à ocupação dos andares, foi-se reparando: porque ao olhar as coisas e as pessoas vejo as metáforas de evolução do mundo que nos cerca. Este gato, por exemplo, caiu de um telhado alto para um terraço: ali ficou ferido e preso que tempos, falei à Câmara, aos bombeiros que responderam nada poder fazer. Eu e uma ex-vizinha em frente, ficamos a alimentá-lo, de longe e como se pôde. O apartamento em questão foi ocupado no início, uns meses? e depois fechou-se para sempre, pelo menos até hoje. A fotografia é de 2011.

E pronto, como esteve/está o país de "calções", aproveitaram os "cações" (que sendo peixe eu até gosto) e nas crises há sempre quem possa fazer negócio. Em tempo de recessão e de doenças. Feito de raiz, nas traseiras, um enorme prédio de escritórios. 


 

E aqui estão a nascer há um ano e tal ?: um hotel improvável em frente, ao lado mais um prédio de não sei quantos andares - sempre um bocado mais altos que o último, que isto de nivelar o luxo é por cima e vende-se o ar bem caro ... Entupir as ruas, entupir as mentes, entupir os horizontes. 



A geração anterior evoluiu, pais e mães que conheci: melhores casas, melhores cuidados, mais liberdade e mais atenção da família. Temo que a "nossa geração" fique entalada, sem hipótese de mudança.

Sinto-me lerda e velha.

Mas para não acabar assim, pêga no entulho, algumas fotos surgidas das tais "metáforas", rasante/secante, em fim de dia pleno, em campo de férias, em reflexos,






Em vigilantes negros. Que gosto se pudesse descansar! Longe.



Thursday, October 12, 2023

Da memória

Porque me parece, no silêncio, nos anos,

que a memória é um frágil e pequeno pássaro na mão.

Não há outra maneira de dizer da falta: saudades do coração das árvores, do vaivém das conchas antigas. Das pessoas que não estão, ou se separaram.


(há mais de dez anos, e sempre)
 


Saturday, July 15, 2023

Cadernos de Lanzarote II - José Saramago

Pág. 63, do 2º caderno. Não me surgiu uma fotografia, surgiram-me as palavras:

"Somos a memória que temos e a responsabilidade que assumimos. Sem memória não existimos, sem responsabilidade talvez não mereçamos existir." 

Talvez ... assome uma visão fotográfica, depois

depois


Sunday, June 25, 2023

A memória do presente

Falávamos as duas a seguir à pergunta: "O Avô vai morrer quando tiver 90 anos?". É inesperada a sensação, como se fica sem jeito e sem palavras para responder a uma coisa tão simples. Entre as ideias que lhe dei -  não se sabe... - de estrelas a milhões de anos luz, onde estão guardadas no tempo infinito todas as imagens e tudo o que se faz, a memória onde sempre vive o que, e de quem, gostamos, fui explicando que a iríamos ver, sempre e quando se lembrasse de nós.

"Eu nunca me vou esquecer de vocês." 


Fiquei com uma onda-nuvem de saudades nos olhos, uma sensação de "para o além", do que se diz ou faz. Um nada silencioso que nos constrange, algures onde se entretecem os fluxos do sangue que nos faz vivos e os sentimentos do amor. Um estrondo como um abismo, algures onde estará, se existir esse lugar no cérebro, a memória do futuro. Um misto de pena e dor antecipada, pela ausência irremediável, pelo desamparo que sentirá quem fica.


Todos os anos, nas muitas grandes ou pequenas saídas, trazia sempre "pedras" ou conchas. Andam por aí, nas gavetas, nos vasos, nos frascos, nas prateleiras. Anos oitenta e antes. A partir de dada altura, em algumas escrevi a data, fui ver: Termas de Monfortinho Outubro 2005, Labruge Outubro 2006, Praia da Lota Setembro 2009, Praia das Bicas Maio 2010, Caminhos de Santiago Setembro 2010, Praia Grande Maio 2011. Além de "beijinhos" e caramujos das praias a Norte, esses em anos muito e muito recuados. Sei que algumas pedras são fósseis pelas figuras e sinais que ali ficaram gravadas para sempre.

E todas mudas, falam de outros tempos. Estas últimas, na varanda de Manta Rota, não as trouxe, ficaram como um "adeus".

Ao mesmo tempo que escrevia, a propósito de tempo/faltas/perdas, recordei a vista em Reguengos de Monsaraz, o antes da Barragem do Alqueva, em Setembro 2001


 



A seguir, um registo da paisagem real - e as de cima foram reais! - o que vi há umas semanas.

E eis como se submergem as coisas físicas mas a terra, por baixo da água, permanece. O céu também é o mesmo. Há o testemunho das memórias, dos que ali viveram, amaram e morreram. 

Mas nunca as árvores. Dá-me pena.

 

Wednesday, June 21, 2023

Músicas e imagens


 Ninguém é de ninguém
Na vida tudo passa
Ninguém é de ninguém
Até quem nos abraça

Não há recordação que não tenha seu fim
Ninguém é de ninguém
O mundo é mesmo assim

Já tive a sensação que amava com fervor
Já tive a ilusão que tinha um grande amor
Talvez alguém pensou no amor que eu sonhei
E que perdi também
E assim vi que na vida
Ninguém é de ninguém

Letra retirada da net, embora eu me lembrasse de toda esta canção, como me lembro de muitas. Por lá encontrei o nome do brasileiro Cauby Peixoto, música editada em 1960. Não sei bem se a ouvia por este intérprete.

Tentei reproduzi-la para reconhecer o timbre. Nada concluí: apenas que muitas vezes acordo com músicas da minha infância. A importância que têm os sons na vida de uma criança! Desde há tanto tempo, para mim, os olhos substituíram os ouvidos.

As imagens do livro que me ocorreram, neste tempo de enervamento e grande espanto, pelas pessoas pequeninas que vou encontrando, no país das minhas vivências. Impossível descrever melhor o que sinto, olhando à volta.

Fica o pensamento, solto.

 

Monday, May 15, 2023

Capital: Paris

A propósito do PPP dia 18 de Maio 2023.

Num lugar mais recatado, este, falo de capitais que conheço: são poucas. Fui aos recônditos das décadas da mente, passei lá adiante, aqui e ali, escolhi Paris. É uma cidade conhecida a pé, do antigo tempo, 1972-1973. Nas passagens de comboio Londres/Porto, Dover/Calais e um dia inteiro na capital de França. A andar de um lado para o outro, sem "museus" mas com ideias muitas. Como diria a Vitorinha "andava a talhar o ar" ou seja, a divagar.

Algumas das velhas fotos







E como não gosto de "faces" aqui apostas e que definam quem é quem, tive a ajuda de M. para o que chamo os seus "malabarismos" que aqui seguem. Uma graça!






Assim, colaborando, com lugares que nos dizem factos e aspectos comuns.